Nos últimos anos, o debate sobre o papel dos biocombustíveis na matriz energética nacional e global intensificou-se, impulsionado pela crescente preocupação com a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e pela busca de alternativas viáveis aos combustíveis fósseis. Nesse contexto, os biocombustíveis emergem como peças-chave na transição para uma mobilidade mais sustentável, favorecida por avanços tecnológicos e novas legislações que ampliam o espaço para fontes de energia renováveis.
Entre as principais diretrizes estão a Lei do Combustível do Futuro, a Reforma Tributária e o Marco Legal do Hidrogênio Verde, que se somam ao já consolidado programa RenovaBio. Além disso, o Projeto de Lei (PL) nº 327, de 2021, que institui o Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), promete estimular ainda mais a transição energética no Brasil. Todas essas medidas visam assegurar a competitividade dos biocombustíveis, consolidando seu papel na redução das emissões de CO₂ e na construção de um futuro mais sustentável.
A mobilidade sustentável tem sido um dos principais focos globais para mitigar os efeitos da crise climática. No Brasil, país com forte tradição agrícola, os biocombustíveis, como o etanol e o biodiesel, têm sido protagonistas dessa transformação. Seu uso massivo é crucial para a redução das emissões de CO₂, especialmente no setor de transporte, um dos maiores responsáveis pela emissão de GEE. A substituição gradual dos combustíveis fósseis por fontes renováveis depende de dois fatores principais: o avanço tecnológico, que permite a utilização eficiente desses combustíveis, e a criação de um ambiente regulatório favorável, que assegure a competitividade dos biocombustíveis em comparação aos derivados do petróleo.
Nesse sentido, os recentes projetos de lei aprovados ou em discussão no Congresso Nacional desempenham um papel decisivo para garantir que os biocombustíveis sejam competitivos e possam expandir sua participação na matriz energética. Esse movimento reforça o compromisso do Brasil em liderar a transição energética global, ao mesmo tempo em que promove a descarbonização da economia.
Sancionada recentemente, a Lei do Combustível do Futuro (Lei nº 14.993, de 8 de outubro de 2024) é uma das mais importantes iniciativas recentes no âmbito dos biocombustíveis. A lei estabelece diretrizes importantes para o uso de etanol e biodiesel no Brasil, visando aumentar a participação desses combustíveis na matriz energética. No caso do etanol, a mistura com a gasolina agora tem um mínimo de 22% em lei, podendo variar até 35%. Atualmente em 27%, um grupo de trabalho, criado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), já estudou a possibilidade de implementação da mistura anidro de 30% no curto prazo.
Além disso, a lei criou uma série de programas estratégicos para fomentar a descarbonização dos transportes e a mobilidade sustentável. Entre eles, destaca-se o Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV), que exigirá dos operadores aéreos, a partir de 2027, o uso de combustível sustentável de aviação (SAF). As metas de redução de emissões começarão em 1%, aumentando gradualmente até 10% em 2037.
Outro programa é o Programa Nacional de Diesel Verde (PNDV), que estabelecerá anualmente a quantidade mínima de diesel verde a ser adicionada ao diesel fóssil, conforme decisão do CNPE. Também foi instituído o Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano, que entrará em vigor em 2026, com metas de redução de emissões a partir de 1%, podendo chegar a 10%.
A lei prevê ainda um marco regulatório para a captura e estocagem de carbono, essencial para mitigar os efeitos das mudanças climáticas. O Brasil pretende evitar a emissão de 705 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂) até 2037, reforçando seu compromisso com a redução dos GEE.
Essa estrutura legislativa visa criar condições para que o Brasil continue sendo referência em mobilidade sustentável e inovação no uso de combustíveis limpos, promovendo um desenvolvimento econômico alinhado com metas ambientais de longo prazo.
Outro marco importante foi a aprovação da Reforma Tributária, que trouxe mudanças significativas para o setor de biocombustíveis. A nova estrutura tributária busca criar um ambiente mais favorável para as energias renováveis, corrigindo distorções que historicamente prejudicavam a competitividade dos biocombustíveis em relação aos combustíveis fósseis. Um dos avanços trazidos pela reforma foi a uniformização da carga tributária sobre o etanol em todo o país, tornando o produto mais acessível e atraente para os consumidores. Além disso, a Emenda Constitucional nº 123/2022 estabeleceu o diferencial competitivo tributário entre biocombustíveis e combustíveis fósseis, garantindo a viabilidade econômica do etanol.
Em agosto de 2024, o Brasil deu um importante passo na direção de uma economia descarbonizada com a sanção da Lei 14.948, que regulamenta a produção, comercialização e uso do hidrogênio verde no país. A nova legislação faz parte de um conjunto de ações voltadas para a descarbonização da matriz energética brasileira. O hidrogênio de baixa emissão, produzido a partir de fontes renováveis como biomassa, etanol, energia eólica e solar, apresenta grande potencial como vetor energético limpo e eficiente. Essa regulamentação visa estabelecer um ambiente favorável ao desenvolvimento dessa tecnologia no Brasil, permitindo que o país se posicione como um dos maiores produtores globais de hidrogênio verde. O marco legal é essencial para garantir o crescimento do setor, ao mesmo tempo em que promove a redução das emissões de CO₂, alinhando o país com os compromissos climáticos globais.
Desde sua criação em 2017, o RenovaBio tem sido a principal política pública para a promoção dos biocombustíveis no Brasil. O programa visa aumentar a produção e o consumo de biocombustíveis no país, baseando-se em metas de redução de emissões para distribuidoras de combustíveis, incentivando-as a utilizar biocombustíveis. O RenovaBio também introduziu o conceito de Créditos de Descarbonização (CBIOs), que podem ser comercializados por produtores de biocombustíveis que comprovam sua eficiência energética e ambiental. Esse mercado de créditos é crucial para garantir a competitividade dos biocombustíveis, ao mesmo tempo em que contribui para a redução das emissões de GEE.
O Programa de Aceleração da Transição Energética (PATEN), ainda em discussão no Senado, é um dos projetos mais ambiciosos para promover o desenvolvimento sustentável no Brasil. O PL 327/2021 visa criar o Fundo Verde, composto por créditos tributários de empresas junto à União, administrado pelo BNDES. O PATEN tem como objetivo garantir financiamentos voltados para projetos de energias renováveis, priorizando a pesquisa em tecnologias inovadoras que tragam benefícios socioambientais. Entre as prioridades estão a expansão da produção de energias solar, eólica e biomassa, além de combustíveis renováveis, como o etanol e o biogás.
Essas iniciativas não só fortalecem a competitividade dos biocombustíveis, mas consolidam o Brasil como líder global na promoção de uma mobilidade sustentável e de uma economia descarbonizada. Com os avanços tecnológicos e o suporte legislativo adequado, o país está preparado para desempenhar um papel decisivo na redução das emissões de CO₂ e na construção de um futuro mais limpo e sustentável.
*Mário Campos – Presidente da SIAMIG Bioenergia
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Fonte: Revista Opiniões – 19/11/2024